ALHO CONFITADO, UM VÍCIO
Alho é divino. Poucos ingredientes podem ter tantos gostos distintos se manuseados corretamente. O mau uso do alho é um crime… Por favor, trate o alho com respeito. ― Anthony Bourdain
Começo esta newsletter com uma confissão polêmica: eu adoro quando minhas mãos ficam com cheiro de alho. Mais alguém? Por favor, não me deixem sozinha nessa!
Com frequência, por questões de convivência social, acabo esfregando as mãos no inox da pia embaixo d'água. Aliás, vocês sabiam que basta fazer isso para o cheiro sair, não é mesmo? Se não, fica a dica para quem odeia esse cheiro divino!
Gosto de alho em praticamente tudo e de todas as formas, incluindo cru: uma salada fresquinha com molho de limão, azeite, sal e alho raladinho? Hummmm. Mas hoje me detenho em um preparo específico: o confitado. Esse método de cocção prevê um cozinhar lento em gordura. Neste caso, no azeite. O resultado é um alho adocicado e macio a ponto de você poder amassá-lo com o garfo. Um vidro de alho confitado na geladeira é sinônimo de muitas possibilidades e de refeição sempre garantida.
Se você não gosta de alho cru, ou mesmo frito, dê uma chance para esse, pois tem sabor e textura completamente diferentes. E aqui vem meu argumento final: não dá (tanto) bafo. Touché!
Até a próxima news,
Lena
*Garlic is divine. Few food items can taste so many distinct ways, handled correctly. Misuse of garlic is a crime... Please, treat your garlic with respect.”
Alho Confitado
A parte mais trabalhosa desta receita é descascar os dentes do alho. Para que tal tarefa não seja tão enfadonha, sugiro preparar uma playlist ou separar um podcast. Dito isso, o resto é fácil, pois inclui apenas colocar o alho e o azeite na panela e cozinhar. Algumas pessoas mais sensíveis podem precisar de luvas de borracha para evitar ardência da pele (sim, já me aconteceu uma vez) - nada que Ana Maria Braga já não tenha tornado normal para nós.
Caso queira apelar na hora de pelar (tu dum-tss), posso dizer que de todos os acessórios de cozinha com uma única função, o descascador de alho de silicone é dos mais úteis e ocupa pouco espaço na gaveta. Não tenho marcas para indicar, mas uma busca rápida na internet te dará algumas possibilidades, com o preço variando de R$ 10 a R$ 35.
Voltando ao preparo, o segredo é prestar bastante atenção na hora do cozimento, porque queremos cozinhar len-ta-men-te, sem deixar que o alho frite. Para isso, você deixará o fogo no mínimo. Porém, cada fogão difere em termos de potência e, muitas vezes, a intensidade mais branda ainda é forte para esse processo. Se esse for seu caso, você terá que ir tirando e colocando a panela no fogo para que a temperatura não suba muito. Ainda assim, é muito fácil!
Como usar
Se você nunca confitou um alho, compartilho algumas ideias do que fazer com ele:
- Massas: amasse e faça como faria num aglio i olio normal. Uma massa com tomates assados ou confitados (que menciono abaixo), ou de abobrinha com queijo de cabra fresco também vai muito bem.
- Torrada: para os amantes da família allium, um bom pão tostado com alhos amassados já é um deleite. Mas você pode ir além e colocar mais algumas coisas por cima, como é o caso da tartine de alho com legumes assados.
- Sanduíches: o alho confitado trará uma camada extra de sabor para os seus sanduíches favoritos.
- Purês: amasse para temperar purês de vegetais variados.
Outros preparos confitados
Faz uns anos que outro preparo confitado apareceu por aqui: os tomatinhos-cerejas. Assim como o alho, ele é uma mão na roda para incrementar e até salvar refeições. Servidos como entrada com uma generosa porção de coalhada ou então nessa tigela de brunch vai superbem.
Veja a receita dos tomatinhos aqui.
Para estudar | Curso sobre Nina Horta com Luiza Fecarotta
Nina Horta é a cronista gastronômica mais importante do Brasil. Seus textos sempre trouxeram um olhar sensível para o que há de mais trivial no nosso cotidiano alimentar. Perdemos Nina em 2019, mas ela segue influenciando leitores, escritores e apaixonados por comida. "Como uma forma de homenageá-la, a jornalista e crítica gastronômica Luiza Fecarotta organizou o curso Nina Horta – Literatura de Sensações. Voltado a interessados e curiosos em comer, cozinhar, ler e escrever, o curso passeará por autores como Antonio Candido, Rubem Braga, Walter Benjamin e Proust, e poetas como Adélia Prado, Manoel de Barros e Fernando Pessoa". O curso, que começou de maneira on-line durante a pandemia (e fui uma das alunas!), agora ganha uma versão presencial na Escola Wilma Kovesi, em São Paulo. Com isso, os alunos ganham degustações de receitas de Nina como mousse de atum, picles de quiabo e pudim de leite. O curso acontece nos dias 1, 15, 22 e 29 de junho das 19h30 às 21h30 e custa R$ 1.480. As inscrições podem ser feitas através deste link.
Para seguir | Raphael Despirite
Raphael Despirite se define como "cozinheiro, estoico, chef do @fechadoparajantar e empreendedor na @suflex.co". Definitivamente, é uma das pessoas mais engraçadas da gastronomia paulistana e eu não poderia concordar mais com ele quando diz que "felicidade é boa comida, boa bebida e baixa expectativa". No seu perfil, compartilha "croniquetas" com reflexões sobre nosso cotidiano, como o Dia do Carbonara ou sobre a feira, da qual extrai o trecho na imagem abaixo. Muitas vezes ele escreve sob uma perspectiva estoica - você o verá com frequência falando dessa doutrina filosófica que tem entre seus principais nomes Sêneca e Marco Aurélio. Parece complexo, né? Mas aí é que está, Despirite faz isso de um jeito leve e engraçado sem nenhuma pretensão professoral.
Já nos stories ele compartilha receitas e, no final, sempre abre a caixa de perguntas para resolver as dúvidas dos seguidores. Divirtam-se com o conteúdo e, como ele sempre diz: evitem miojo!
Siga o Raphael Despirite AQUI!
Para ler | Sonhos fritam em silêncio
Eu já li e reli esse texto da Heloisa Lupinacci algumas vezes. Sonhos fritam em silêncio é afiado, engraçado e delicioso. Para quem não a conhece, ela é jornalista e, por anos, pudemos ler sua coluna sobre cerveja (que se chamava Só de birra), no caderno Paladar do jornal O Estado de São Paulo. Hoje em dia ela mora nos Estados Unidos, de onde escreve a newsletter Caracteres com espaço.
Nesta reflexão cheia de onomatopeia, sinestesia e aliteração, Heloisa nos ensina sobre os tipos de fritura, os processos de escurecimento e consegue chegar até os Beatles, relacionando “I am the Walrus” com ovo frito. Palmas! Deixo vocês com um pedacinho desse texto para que fritemos todos juntos:
O som da fritura fritando é txxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx. Mas suas nuances dependem do óleo - da sua textura, da temperatura. Se a fritura for industrialzona, com óleo ralinho, usado e reusado, sujo cheio de pó preto do resto das levas anteriores, faz um sssssh sosso, sibilante, sem viço.
Se for fritura caipira faz um plócs: txplóc-txxplóc, eia, cavalinho. É que naquela banha às vezes tem um tico de água e vai dando esses pipoquinhos. E sem falar que tem gente na roça que pinga água no bife. Upa, upa, frigideira.
A fritura mais profissa, com óleo novinho na temperatura certa, faz um barulho de plateia em fim de espetáculo. É um tchuóóóóó com algo de ovação. Um som borbulhante sólido e pelando.
Para ver | Cozinhas inspiradoras
Eu tenho uma tara por cozinhas. Gosto de ficar vendo em revistas, no Pinterest e no Instagram. Me imagino cozinhando nesses espaços, o cheiro que cada lugar tem, a vista das janelas, o quão acolhedoras devem ser...
Há tempos que salvo as que acho mais bonitas e que penso em como compartilhar tudo isso, pois sei que muita gente aí também se sente inspirado diante de belas cozinhas. Pois o Substack, plataforma de newsletters para escritores e leitores (e através da qual eu envio a minha news), criou o Notes - um espaço pensado para que os autores possam compartilhar links, fotos, pensamentos, compartilhar outras newsletters de que gostam e por aí vai. É uma espécie de Twitter próprio. Pois eu, que já andava meio desligada do Twitter, resolvi usar o Notes para compartilhar todo esse conteúdo tão bem guardado.
Como acessar o Notes
Ao acessar o meu perfil (ou de qualquer outro autor que você leia), haverá a seção "Notes" justo ao lado da seção "Posts", como vocês podem ver abaixo. É só clicar e rolar para ver o conteúdo.
Vale a pena ler de novo
Como nem todos vocês estavam aqui desde o começo desta newsletter, decidi recapitular os conteúdos dos últimos quatro anos. Tem muita receita, dicas, playlists e conteúdos bacanas:
Há um ano: eu estava de licença maternidade
Há dois anos: Um rolê pelo mundo dos vinhos
Há três anos: Amor em tempos difíceis e Mais chocolate, por favor
Há quatro anos: Quem divide, multiplica e Carne moída para sair da mesmice
Eu também, Tutu!
Créditos
Fotos: Bruno Geraldi | Revisão: Eloah Pina
apaixonada pela sua news, Lena! E louca pra testar o alho confitado. Amo alho e amo confitar! Salivei!
(agora o cheiro na mão, num dá. num dá não. descupa aí, mas num dá).
Adoreiiiii!!!