UM ROLÊ PELO MUNDO DOS VINHOS
“Comi as ostras, que possuíam forte gosto de mar e um leve travo metálico que o vinho branco gelado lavava, deixando somente o gosto de mar e a suculenta textura; à medida que ia sorvendo o líquido frio de cada concha e o fazia descer acompanhado do estimulante sabor do vinho, o sentimento do vazio me foi abandonando e me vi de novo feliz, cheio de planos.”
― Ernest Hemingway, Paris é uma festa*
Nem todo mundo que assina esta news sabe, mas comecei minha carreira na gastronomia pelos vinhos. O ano era 2009 e eu, com 24 anos, tinha abandonado um trabalho na área de marketing em uma multinacional e me mandado para Paris com o intuito de fazer um curso de francês de três meses, além de pensar nos meus próximos passos. Naquele curto período, vivi intensamente a rica cultura gastronômica da França, das padarias às lojas de queijos, açougues, confeitarias, livrarias especializadas em culinária até os maravilhosos vinhos nacionais. Era um país inteiro respirando gastronomia, e a minha experiência foi, como diriam os franceses, un coup de coeur! A partir de então, um curso breve de vinhos, somado à leitura da biografia da crítica Jancis Robinson, abriu meus horizontes e me levou ao curso de formação em sommellerie do Le Cordon Bleu. De volta ao Brasil, passei a trabalhar como sommelière no restaurante Vito, na época chefiado por André Mifano.
Foram dois anos de muito aprendizado sobre vinho, serviço e hospitalidade. A sensação que eu tenho é de que a vivência em um restaurante é tão intensa que é como se o tempo fosse o dos cachorros - um ano equivale a sete! Trabalhei muito durante dois anos, seis dias por semana, nos períodos do almoço e jantar; não folguei aos fins de semana ou feriados. Descanso tinha só nos recessos de final de ano e carnaval. E quer saber? Nunca aprendi tanto em minha vida toda! Morro de saudades de servir pessoas, de descobrir com três ou quatro perguntas qual o vinho ideal para elas e de ver a alegria estampada no sorriso de um comensal satisfeito.
Fazia tempo que eu queria falar sobre vinhos por aqui e, inspirada por Eric Asimov - colunista do New York Times - , achei que o melhor caminho seria começar por um kit básico para quem quer curtir este rolê. Não estou muito interessada em vinhos com preços astronômicos, por mais gostosos e interessantes que possam ser. Conhecer vinhos é saber a respeito do trabalho no campo, das pessoas, países e culturas gastronômicas; trata-se de compartilhar, brindar e celebrar. Entender sobre esse universo nos permite aumentar o prazer de uma refeição. De qualquer forma, não acho que todo mundo precise entender sobre o assunto, e tudo bem querer saber só um pouco, ou apenas o suficiente para conseguir se virar numa loja. Degustar e comentar sobre vinhos tem hora e lugar (não seja inconveniente); há vinhos que podem ser degustados, mas também há vinhos para serem apenas bebidos (e tudo bem. Quer dizer, ainda bem!). Profissionalmente, usamos uma tabela de aromas (reconhecíveis por todos) e não existe esta história de descrever o vinho como "cheiro de couro da bolsa da minha avó". E muito importante: você não precisa gastar rios de dinheiro para ser feliz bebendo vinho. Claro que com a economia do jeito que está e com o aumento do dólar, os preços subiram consideravelmente. Lembre-se disso nas próximas eleições, tá ok?
Dito isso, a ideia aqui é apresentar um kit básico de ferramentas e leituras para, posteriormente, nos lançarmos aos rótulos (sobretudo os de bom custo-benefício). Claro que se você tomar gosto pela coisa, pode subir os degraus: investir em taças melhores, um decanter bonitão e, por que não, uma adega. Mas, por enquanto, vamos nos deter ao básico.
Sigamos nos cuidando, usando máscara, respeitando o distanciamento social e usando álcool gel. Até a próxima news,
Lena
*“As I ate the oysters with their strong taste of the sea and their faint metallic taste that the cold white wine washed away, leaving only the sea taste and the succulent texture, and as I drank their cold liquid from each shell and washed it down with the crisp taste of the wine, I lost the empty feeling and began to be happy and to make plans.”
― Ernest Hemingway, A Moveable Feast
TER O BÁSICO SEM GASTAR MUITO
Abridor de sommelier
Não abro mão deste que é conhecido como saca-rolha de duas fases. Não tem invencionice, abridor elétrico e design "chique" que supere a funcionalidade e praticidade deste. É barato, leve, pequeno, fácil de guardar no bolso e uma vez que você pega o jeito, não tem erro. Deixo AQUI, a leitura da seção “Objeto de análise” da revista Gama como sugestão. Você encontra facilmente em lojas de bebidas e internet afora a partir de uns R$ 40.
Taças
Esse aqui é um universo à parte: elas podem ser de vidro, cristal, titânio... Existem ainda os formatos extremamente específicos para determinados tipos de vinho e por aí vai. Mas, para começar, tenha taças médias, com haste (elas servem para você não esquentar o vinho) e que não sejam muito rasas, pois você precisa conseguir girar o vinho e sentir os aromas sem jogá-lo para fora. Idealmente, elas são levemente afuniladas na boca para concentrar os aromas. ESTA TAÇA da Schott Zwiesel é um bom negócio.
Decanter (ou Erlenmeyer)
O decanter não é essencial, mas é útil, pois ele pode potencializar um vinho que esteja fechado, ou seja, que precisa entrar em contato com o ar para liberar seus aromas. Os de vidro são mais simples e acessíveis, mas dependendo da marca e do modelo podem custar muito caro. Uma alternativa bacaninha, sugerida por Eric Asimov em sua coluna, é usar um erlenmeyer de 1L. O da foto foi comprado no mercado livre por mais ou menos R$ 70.
PARA LER | WINE FOLLY E JANCIS ROBINSON
Um dia, o dono de um hotel muito famoso que queria me contratar disse que, pra entender de vinhos, cursos e livros eram uma perda de tempo, e que o importante era apenas beber. Ele me ofereceu a vaga, mas não aceitei. Acredito que estudar sobre vinhos seja tão importante quanto bebê-los. Aqui estão duas dicas de leituras fáceis para quem está começando. A primeira delas é da autora Jancis Robinson, crítica inglesa respeitadíssima, que vai direto ao ponto em seu Expert em vinhos em 24h, dosando bem a quantidade de informação sobre cada assunto: como comprar vinhos em uma loja ou um restaurante, como ler rótulos, harmonizações, dicas essenciais etc. Apesar da foto ser da versão em inglês, ele já foi traduzido para o português. Custa R$54,90 no SITE DA EDITORA PLANETA. Já o livro Guia essencial do vinho, do site WINE FOLLY, é um pouco mais extenso, mas muito visual! Aborda os fundamentos, principais uvas e estilos e as regiões produtoras. Os gráficos são muito educativos e ajudam na memorização. Custa R$59,90 no SITE DA EDITORA INTRÍNSECA.
PARA OUVIR | UM TINTO NUMA NOITE DE INVERNO
O inverno chegou oficialmente e, aqui em São Paulo, as noites frias já nos convidam a beber uma taça de vinho tinto. Pode ser para acompanhar um bom jantar, mas também uma boa playlist, enquanto se está jogado no sofá ou até mesmo deitado no chão embrulhado numa coberta. Deixo AQUI uma sugestão de trilha sonora para a sua sexta a noite :)
PARA SEGUIR | AS MINA PÁ!
Tem muita gente falando sobre vinhos por aí. Hoje, indico minas muito legais e entendidíssimas do assunto. Entre elas estão sommelières, jornalistas e consultoras. Sigam: @DANIELABRAVIN, @CASSIACAMPOS, @GABRIELAMONTELEONE, @CONFRARIADASPRETAS, @SUZANABARELLI , @ISABELLEML, @ALEXANDRACORVO, @GABRIELLIFLEMING, @LISCEREJA e @JESSICAMARINZECK .
PARA OUVIR | CONVERSA DE SEGUNDA
Bati um papo superlegal com a empreendedora e chef de cozinha LARISSA ABBUD no seu podcast Cozinha de segunda. Falamos sobre redes sociais para negócios de gastronomia e contei um bocado da minha trajetória profissional até chegar à comunicação gastronômica. OUÇA AQUI!