RICOTAS CASEIRAS E MORANGOS ASSADOS
Duas versões desse queijo delicado, delicioso e fácil de ser feito em casa!
Você já comeu um queijo feito na hora? A minha primeira vez foi na Serra da Canastra (MG). Eu tirei o leite da vaca, misturei o coalho, esperei um pouco, então cortei a massa do queijo, a separei do soro, despejei nos moldes, salguei e esperei algumas poucas horas — o mínimo para que pudéssemos desenformar e ele se manter inteiro. Era um queijo da região, fresquíssimo, daqueles que costumamos chamar de queijo branco. Nunca vou me esquecer do sabor adocicado do leite e da textura cremosa, tudo isso envolvido pela magia de fazer sua própria comida.
Fico me perguntando se o extraordinário disso vem do fato de estarmos cada vez mais longe da origem da nossa comida e termos cada vez menos conhecimento sobre os processos e, então, cada vez menos autonomia. Mas acho que além de ser revelador nesse sentido, sempre haverá algo extraordinário e mágico no fato de misturar leite, suco de limão e sal e ver a mistura virar queijo em menos de uma hora. Pelo menos, para mim, a química da transformação não cessa de encantar.
Fazer uma ricota caseira não tem todo o romance da fazenda que acabo de mencionar, mas segue sendo minha, feita com as minhas próprias mãozinhas no aconchego da minha casa para ser compartilhada com os meus.
E digo mais: a ricota caseira é melhor e mais barata do que muitas opções à venda no mercado. Aqui na Europa, eu ainda tenho acesso a ricotas excelentes, dessas com sabor de leite bem presente e cremosas, a preços razoáveis. Mas, no Brasil, me lembro de ficar um bocado decepcionada com a maioria das ricotas à nossa disposição, que eram ressecadas, esfarelentas e insossas.
Fazer a própria ricota está ao alcance de todos e é dessas atitudes que são um caminho sem volta. Pelo menos foi assim aqui em casa. E agora sempre temos um pote de ricota ou de coalhada — ou das duas — na geladeira. Um luxo!
Para acompanhar, morangos assados com balsâmico — sim, sigo assando minhas frutas. Tem muita gente que vai achar essa combinação de morango com balsâmico cafona, como já ouvi anteriormente. Mas eu não acho que esse seja um adjetivo que se aplique à comida gostosa. Se é bom, não pode ser sinônimo de falta de bom gosto.
Até a próxima news,
Lena
DUAS RICOTAS E MORANGOS ASSADOS PARA ACOMPANHAR
Eu não trago uma, mas duas receitas de ricota: uma versão leve, na qual o leite é misturado com pouco sal e suco de limão, resultando em uma ricota bem fresca; e a segunda, bem mais cremosa, pois o leite é misturado ao creme de leite fresco. É deliciosa, mas além de mais cremosa, ela também será mais gordurosa e um pouco mais cara, dado que 500ml de creme de leite fresco anda custando entre R$20 e R$30 — a depender da marca e do mercado.
Fica a seu critério e de acordo com seu paladar, suas possibilidades de investimento e finalidades de uso.
Trago ainda uma terceira receita, na esteira da última edição (que dediquei às frutas assadas), de morangos assados que combinam muitíssimo bem com essas ricotas — e um tanto de outras coisas.
O QUE É RICOTA?
Eu não sou nenhuma especialista em queijos, mas, basicamente, este é um queijo de origem italiana cujo nome, ricotta, é derivado da expressão re-cotto, ou seja, algo re-cozido, cozido outra vez. Isso porque, tradicionalmente, ela era feita a partir do soro que sobrava do feitio de outros queijos. Esse soro era então cozido mais uma vez e dava origem a esse queijo leve e aerado.
Porém, nós faremos a ricota a partir do leite. O processo também vai nos render certa quantidade de soro — uma água turva e bem azedinha, riquíssima em proteína. E o soro nada mais é do que o famoso whey que vemos em produtos proteicos como shakes e barrinhas. Falo mais sobre ele abaixo.
O LEITE
O leite é o principal ingrediente da ricota, e há dois fatores muito importantes aqui:
O leite deve ser integral para que possamos obter uma ricota mais saborosa e com uma textura melhor. Afinal é a gordura do leite que ajuda tanto no sabor quanto na cremosidade.
Use leite pasteurizado! Os leites de tipo UHT (aqueles que estão nas estantes não refrigeradas do mercado) não vão funcionar, uma vez que o processo deles, chamado Ultra High Temperature (temperatura ultra alta) altera a estrutura de suas proteínas impedindo que ele coagule. O ideal seria um leite cru, mas como essa não é a realidade da maioria de nós, o leite pasteurizado (aquele que fica na prateleira refrigerada do mercado) funcionará.
O SUCO DE LIMÃO
A ricota é um produto da acidificação do leite, processo que acaba por separar o soro dos coágulos. Podemos usar ingredientes convenientes que temos sempre à mão para tal: o suco de limão, que é o que eu uso, ou vinagre de vinho branco. Fica a seu critério.
O SAL
A ricota é originalmente um queijo com pouquíssimo sal. As boas ricotas trazem um sabor lácteo bem marcado e, por isso, uma doçura delicada. Porém, existe a ricotta salata. Nela, o processo de salga acontece posteriormente ao feitio do queijo. Quem sabe numa próxima edição, depois que todos estiverem craques em fazer ricota, a gente não aprende a fazer essa outra versão?
O SORO OU WHEY
Antes de mais nada, peço que prove seu soro ao fazer a ricota. Provar preparos em seus vários estágios nos ajuda a ter outro nível de compreensão do preparo e dos sabores. Tenho ainda mais um pedido: não jogue seu soro fora, pois ele é valioso! Ele é saboroso e nutritivo, rico em proteínas. Podemos usá-lo de várias maneiras, sendo a primeira para fazer outra ricota, essa sim “re-cozida”.
Eu prefiro usá-lo no preparo de lentilhas. Como ela é a principal acompanhante do arroz aqui em casa, faço com muita frequência. Mas você pode usar de outras formas:
Em sopas, feijão e outros preparos caldosos, adicionando parte água e parte de soro.
Para marinar carnes, tornando-as mais tenras e suculentas.
Para fazer vitaminas e outras bebidas
Para beber puro — sim, há quem o faça. Eu acho difícil, mas usaria para diluir um iogurte e fazer um ayran –– aquele iogurte salgado que as pessoas bebem cotidianamente na Turquia e que mencionei no Guia.
Quem mora em/tem sítios e fazenda pode usar para adicionar à ração dos animais.
Não jogue fora esse líquido versátil e naturalmente nutritivo — e pelo qual a indústria cobra tão caro.
A RECEITA PODE VARIAR
A verdade é que toda e qualquer receita pode variar, por mais chato que essa afirmação possa soar. Isso porque os ingredientes, as potências do forno e do fogão, o material do qual é feito a panela ou assadeira, a atenção que colocamos no preparo, a prática que temos ou a falta dela… enfim, tudo pode variar. E tudo bem. É justamente por isso que gosto de falar dos componentes e das possibilidades, para que vocês saibam contornar as situações mais diversas e corriqueiras. Aprender a cozinhar envolve saber ler a receita, mas não só isso.
Assim sendo, a ricota também pode variar. Acho que a variação mais possível seria sobre a quantidade necessária de ácido em função de particularidades da pasteurização do leite ou do ácido usado.
A receita abaixo funciona para mim todas as vezes, e ela usa 100ml de suco de limão para cada 1,5L de leite (ou leite com creme de leite) e considera um tempo de até 30 minutos para coagulação e separação do soro.
Caso o seu leite não coagule dessa maneira, experimente adicionar uma colher de sopa a mais de suco de limão e espere 5 minutos para ver o que acontece. Só não adicione muito mais do que isso, pois pode influenciar no sabor final.
COMO USAR A RICOTA
A ricota tem diversos usos, seja como um simples queijo para ser adicionado ao pão no café da manhã, seja para incrementar saladas, sanduíches, ser a base de um molho ou recheio de uma lasanha.
Você também pode usá-la para fazer doces, seja a combinando com caldas de frutas ou frutas assadas — como os morangos abaixo —, ou para fazer bolos, muffins, sorvetes entre outros. Retomo quatro receitas que compartilhei com vocês anteriormente:
MORANGOS ASSADOS
Esta é mais uma das receitas de frutas assadas, pelas quais advoguei na edição anterior. Neste caso, além de todos os benefícios que eu tinha listado, acrescento o fato da fruta ficar ainda mais bonita!
Aqui temos: morangos + açúcar de confeiteiro + vinagre balsâmico. Os morangos são assados até que fiquem macios e cujo tom se intensifica não só pelo processo de cozimento, mas por conta do vinagre. Ao final, eles ficam numa cor vermelha-rubi linda e brilhante!
Você pode tanto pôr a ricota sobre uma fatia de bom pão de fermentação natural e cobrir com os morangos para ter um café da manhã luxuoso, quanto comer apenas a ricota com os morangos para obter uma sobremesa delicada, levemente adocicada, e deliciosa.
RECEITAS:
PARA LER | OS MELHORES TRECHOS DE COMIDAS DA LITERATURA
Quais são as melhores passagens de comida da literatura? Boa pergunta!
Um desafio e tanto elencar tais trechos, considerando o tanto que é preciso ter lido para escolher. Pois o escritor Adam Roberts, autor do livro Food Person, tentou elencar cinco delas.
Para ele, as cenas de comida na literatura costumam aparecer em momentos carregados de emoções: “Uma coisa é você comer um doughnut com geleia; outra coisa é comer um doughnut com geleia depois de pegar seu marido na cama com a sua irmã”. Puxado.
O gourmand francês Brillat-Savarin cunhou a famosa frase “me diga o que comes e te direi quem és”, e, segundo Roberts, as melhores cenas de comida da literatura fazem justamente isso: jogam luz aos personagens e suas histórias. Charles Dickens, Nora Ephron e Tolstói estão entre suas escolhas. Leia mais aqui.
A seleção me fez lembrar do texto da cozinheira Clarice Reichstul, autora da news Deus fez a comida e o diabo os cozinheiros, que ao falar sobre a demora na escrita, retoma cenas de comida do clássico Mrs. Dalloway, escrito por Virginia Woolf.
“[...] Antes porém, vamos comer”, disse.
E logo teve início uma silenciosa e impecável movimentação, através das portas de vaivém, das criadas com uniformes e toucas brancas, não serviçais por necessidade, mas adeptas de um mistério ou de uma majestosa impostura praticada pelas anfitriãs em Mayfair de uma e meia às duas, quando, com um aceno da mão, cessa a azáfama, e em seu lugar surge essa ilusão profunda acerca sobretudo da comida — como se fosse gratuita; e, depois, como a mesa se põe a si mesma, por vontade própria, com copos e prataria. Guardanapos, pratos de frutas vermelhas; películas de creme escuro ocultam o linguado; frangos despedaçados boiam em caçarolas; crepita o fogo, colorido, pouco doméstico; e com o vinho e o café (também gratuitos) elevam-se visões aprazíveis diante dos olhos cismadores; olhos para quem a vida parece musical, misteriosa; olhos ora iluminados para observar com simpatia a beleza dos cravos vermelhos que lady Bruton (cujos movimentos eram sempre angulosos) colocara ao lado de seu prato […]”
PARA PÔR EM PRÁTICA | COMO CONSUMIR MENOS PLÁSTICO
A revista Gama fez um especial sobre o tema da ingestão de microplástico, “um dos maiores problemas de proteção ambiental e saúde pública do nosso tempo”:
Se você ainda não topou com essa palavrinha por aí, microplásticos são partículas de plástico com menos de cinco milímetros de comprimento, criadas de uma das duas formas: pela degradação de plásticos maiores ou por geração intencional dessas partículas, como as que existem em cosméticos ou até o glitter. O problema, porém, é menos o que são, e mais onde eles estão: basicamente, em todo lugar. No fundo do mar, nas nossas roupas, nas garrafas em que bebemos água e até no ar que respiramos, os microplásticos sempre estão lá. Estudos mais recentes inclusive identificaram sua presença no corpo humano, em órgãos como pulmões e até o cérebro.
Leia a entrevista com o pesquisador Richard Thompson, que cunhou o termo “microplástico” e é a maior autoridade no assunto, tendo entrado para a famosa lista das 100 pessoas mais influentes do mundo da revista Time.
Entenda por que precisamos focar mais nas ações de governança e de regulação, e menos na questão do comportamento ou do consumo, como a redução do consumo de água de garrafas de plástico.
Ouça o episódio do podcast da revista que conversa com a pesquisadora Thais Mauad. Ela nos alerta para os perigos do microplástico e para a onipresença deles, sobretudo nas comidas e bebidas. Afinal, se nem ao tomarmos água filtrada nos livramos dele, uma vez que os encanamentos são em boa parte feitos de PVC, quais sao as alternativas? Mauad afirma: “Podemos tentar evitar o uso do plástico principalmente na cozinha porque, além do microplástico, existe outro problema muito grave que são os aditivos. São 13 mil substâncias que podem ser adicionadas, das quais só 4 mil são estudadas. E 1.500 delas sabe-se que têm efeito cancerígeno ou disruptor endógeno”.
Ponha em prática essas cinco dicas para consumir menos plástico.
PARA ADMIRAR | OBJETOS DE MESA DA TAVARES
Estou apaixonada pelos objetos de mesa da joalheria portuguesa Tavares, de Póvoa do Varzim. Fundada em 1922, a empresa ficou famosa pelos ornamentos mais tradicionais: brincos, anéis, pulseiras e afins. Mas, para mim, são os objetos de mesa — ou melhor, joias de mesa — que mais chamam a atenção.
Ali, conchas naturais são misturadas à prata para dar vida a potes, colheres, pratos, castiçais e enfeites de mesa que giram em torno do tema alimentar. Os preços são tão salgados quanto os das joias. Acesse o site | Acesse o Instagram
Créditos:
Revisão: Eloah Pina
Que aula! Já fiz ricota em casa (no filtro de café para separar o whey) e agora estou na onda do iogurte caseiro para economizar alguns tostões por semana. A delicadeza dos sabores desses derivados feitos em casa é algo que me impressiona.
Love ricotta!