PAPPARDELLE COM CAMARÃO E MINHA NOVA AVENTURA À LA JULIA CHILD
A vida é uma combinação de magia e massa. —* Federico Fellini
Estar numa cozinha me proporciona um sentimento difícil de descrever. É como se, apesar de estar muito séria e concentrada, eu estivesse sempre sorrindo por dentro. É por isso que estou até agora me beliscando, já que há exatas quatro semanas comecei meu curso de cozinha na Escuela Hofmann, uma instituição similar à escola francesa Le Cordon Bleu aqui de Barcelona, mas não tão antiga — esta data de 1895 enquanto a primeira, de 1983. As salas de aula são cozinhas profissionais lindas e estudamos vestidos comme il fault, paramentados com dolma, avental e um belo conjunto de facas — tudo com nossos nomes gravados.
Entre 2009 e 2010, morei em Paris e me graduei como sommelière no Le Cordon Bleu — um curso incrível e muito interessante, mas que acontecia em um prédio do outro lado da cidade, bem distante da escola original que habitava os meus sonhos. Além disso, quanto mais aprendia sobre vinhos e mais comia em Paris, mais eu percebia que queria aprender a cozinhar, sobretudo depois que queimei a panela do meu amigo Fernando Eichenberg tentando fazer um molho branco com funghi, mas essa história eu conto outro dia. Desde então, acho que vivi flertando com a cozinha. Em 2013, no Brasil, fiz o Curso Objetivo de Chef, da Escola Wilma Kovesi, e foi como se tivessem me aberto as portas de um universo mágico do qual eu nunca mais quis sair.
Agora, ao me matricular nesse novo curso, não pude evitar lembrar de Julia Child e de seus relatos em Minha vida na França (ed. Seoman), livro em que narrou os anos que passou em Paris estudando no Le Cordon Bleu e sua guinada dentro do universo culinário. Além de começar a estudar as técnicas de cozinha, também percorro os mercados da cidade querendo aprender sobre os queijos, cortes de carnes e embutidos locais e quais são as frutas de cada estação; me esforço para conhecer melhor os vinhos catalães e espanhóis e me maravilho nas lojas de utensílios, sonhando com preparos deliciosos para compartilhar com aqueles ao meu redor.
Pelos próximos dez meses, estarei na cozinha para aprender o básico — o curso que escolhi contempla somente o nível um de um total de três. Na primeira aula prática, o professor, chef Morros, anunciou: "Hoje vamos começar aprendendo sobre os tipos de cortes" e com um sorriso irônico, gentilmente abriu uma caixa de band-aids sobre a mesa central. De fato, aprendi sobre como cortar cenoura em mirepoix, émincer e brunoise ou uma cebola em ciseler, mas não pude evitar cortar o meu próprio dedo — assim como alguns outros colegas. Acho que foi o corte mais feliz que já fiz! Com sorte e empenho, espero transformar toda a gratidão que ando sentindo em ótimos gratinados.
Hoje, enquanto esta edição pousa na caixa-postal de vocês, estarei aprendendo sobre ligazones, ou espessantes, me empenhando muito para não cortar mais nenhum dedo. Já vocês, podem começar a se preparar para fazer essa massa com camarão, creme e açafrão que é tão deliciosa quanto vistosa!
Até a próxima news,
Lena
*La vita è una combinazione di magia e pasta.
Pappardelle com camarão, creme e açafrão
Eu comeria massa todos os dias. Acho que, para o meu próprio espanto, eu gosto mais de macarrão que de arroz e feijão. Alegria era chegar em casa da balada, nos longínquos anos em que eu ia para a balada, e encontrar macarrão com molho na geladeira. Batia um pratão, dormia feliz e acordava muito melhor do que acordaria sem aquela boquinha da madrugada.
Os anos passaram, as baladas rarearam e os pratos de macarrão evoluíram um pouco. Assim, sugiro essa receita deliciosa, diferente das que comemos em casa rotineiramente e que com poucos ingredientes e mínimo esforço pode elevar o seu jantar em um dia qualquer.
Aqui, camarão, alho, vinho branco, creme de leite e açafrão se unem em um molho de cor vibrante e sabor delicado. É tudo muito rápido já que o camarão cozinha num piscar de olhos. E atenção, os italianos não recomendam queijo ralado em massas que levam peixes e frutos do mar, ok? Para mim, uma bela pimenta-do-reino moída na hora é suficiente para arrematar a finalização.
Sobre o açafrão
Infelizmente, o açafrão é um ingrediente caro. Atenção para não confundi-lo com o açafrão-da-terra (leia-se cúrcuma) que é vendido em pó, ok? Estou falando dos pequenos e finos pistilos das flores Crocus sativus que são colhidas à mão e, assim, tem seus pistilos minuciosamente separados. Antigamente, a Espanha era um dos grandes produtores de açafrão, mas nos últimos anos a produção caiu de mais de 6 mil ha para menos de 200 ha* e, hoje, quase 90% de todo o açafrão do mundo vem do Irã.
Sobretudo para quem nunca provou um prato feito com açafrão, vale se programar para fazer o investimento. O site da La Pastina oferece a iguaria. Inclusive, vi que esses dias que havia duas opções em promoção. Mas você também encontra em outras lojas de produtos importados. Lembrando que ele vem em pequenas quantidades porque é usado de maneira bem comedida: uma colher de sopa já trará bastante cor e sabor para o prato. Prefira os pistilos no lugar da versão em pó.
Dito tudo isso, prometo que vocês comerão esse prato se deleitando como a Tânia na Sicília (e se você não assistiu a série The White Lotus, já tem programa garantido para o final de semana).
*Fonte dos dados de produção do açafrão: Food of Spain, de Claudia Roden (2012).
Veja a receita completa no PDF abaixo!
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